O movimento da Independência do Brasil foi realizado de modo diverso do que ocorreu no restante da América Hispânica, uniformemente republicana (mais por ausência de dinastias que por falta de vontade nos homens). Consistiu no fato do Brasil já possuir uma vocação civilizatória e, deste modo, repetir as características de Reino autônomo, existente antes mesmo do “grito do Ipiranga”.
Os brasileiros não se tornaram independentes rebelando-se contra o Príncipe Regente. Pelo contrário: tiveram nele um aliado, uma referência, um símbolo para o desenvolvimento da identidade.
Nossa Independência se fez de modo todo especial. Não foi um fato que se esgotou em si mesmo, mera “libertação” de Portugal. Tem-se a equivocada impressão que éramos um povo de segunda categoria e que a Independência nos transformou em um Estado Soberano. Ora, o Brasil não era colônia de Portugal e, sim, Reino Unido.
A Independência foi um fato resultado de um ato de vontade nacional único, formado por duas vontades distintas que soberanas, cooperaram para fundar as bases do que seria um “Grande Império na América”.
Como num casamento, quando duas pessoas, com a mesma vontade, se unem livremente e assumem compromissos diversos - amor, fidelidade, vida em comum - assim ocorreu na Independência de nosso país. Duas vontades fizeram a Vontade da Nação Brasileira em 1822: a vontade do Povo e a vontade do Estado, ambas legitimamente expressas por seus órgãos autorizados. Desta confluência nasceu a Vontade Nacional.
A 1° das vontades, a do povo, foi devidamente expressa nas Câmaras Municipais, que legalmente representavam as cidades e vilas, nas Juntas de Procuradores das Províncias, bem como por meio de amplas manifestações escritas, assinadas por pessoas de projeção social nos diferentes lugares. A opinião pública foi formada através de jornais, comícios e associações dos mais variados tipos. Todo esse consenso político, que não pode ser desprezado, como se nosso povo, à época, fosse um amontoado de energúmenos, tinha por objetivo supremo a Independência: autonomia, liberdade e voz própria a ser conseguidas não somente com a separação de Portugal, mas com a criação de instituições representativas próprias.
Os nossos juristas já compreendiam então que os planos das Cortes Portuguesas reunidas em Lisboa, em 1821 queriam transformar o Brasil em província de segunda categoria. De fato, queriam nos rebaixar a esse status, justo a nós habituados as mais amplas liberdades municipalistas desde os primórdios do povoamento do território.
Quando, pois, a vontade do povo pediu ao Príncipe que ficasse e que separasse o Brasil de Portugal, não era rebelião que pregavam. Queriam apenas que o Príncipe não acatasse a tomada de autonomia política aos brasileiros por parte das Cortes Portuguesas e que, se a convivência não fosse possível em pé de igualdade, que cada nação seguisse seu próprio rumo com liberdade.
A 2° vontade, a do Estado - presente aqui desde 1549 quando fora criado o Governo Geral do Brasil, responsável por dar início a identidade política brasileira haja vista inexistir aqui, à época, cidadãos com consciência história de pertencerem a uma mesma nação -, que sempre fora capaz de dar ao povo os contornos da nacionalidade, era exercida por D. Pedro I que ao proferir o “Sim” aos apelos populares para que ficasse no Brasil, estava apenas repetindo o gesto de dois fundadores de dinastias, antepassados seus: D. João I e D. João IV de Portugal, ambos reis pela vontade do povo, e não por vontade própria.
O resultado concreto foi a fusão das duas vontades: a do povo e a do Estado, num ato único, um verdadeiro, ato legislativo. Uma outorga Constitucional respaldada pelo apelo Constituinte das Câmaras municipais. Nossa Independência foi uma sanção legislativa do Imperador: O povo brasileiro quis e eu sanciono. As duas vontades, portanto, uniram-se num ato legal único, por todos os motivos. E este ato legal se desdobrou em 3 consequências: o Brasil seria uma nação soberana que não admitiria qualquer laço de sujeição com outras; o Brasil seria uma nação organizada nos moldes do sistema constitucional representativo: o Brasil teria um governo monárquico na sucessão de D. Pedro II.