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A Câmara dos Deputados aprovou, em dois turnos, a chamada PEC da Blindagem — 353 votos a favor no primeiro, 344 no segundo —, que condiciona o processo criminal contra parlamentares à autorização prévia da própria Casa. O texto ainda vai ao Senado, mas já consagra um privilégio que fere a igualdade perante a lei: deputados e senadores passam a decidir se eles mesmos devem responder a acusações.
Havia previsão de voto secreto, mas a expressão foi retirada após destaque. Mesmo assim, a essência da blindagem permanece: denúncia só avança se autorizada pela maioria, no prazo de até 90 dias; prisões apenas em flagrante de crime inafiançável, com chancela em 24 horas; e ampliação do foro para presidentes de partidos com representação no Congresso.
A proposta agrava um problema histórico da política brasileira: a baixa accountability, ou seja, a frágil responsabilização de autoridades perante as instituições e a sociedade. Ao transferir para o próprio Parlamento a decisão sobre quem pode ou não ser julgado, reduz-se a responsabilização horizontal e consolida-se a cultura da impunidade. Em vez de fortalecer os mecanismos de controle, o Congresso fecha-se em um círculo de autoproteção, aumentando o abismo entre cidadãos comuns e representantes.
Em democracias consolidadas, como Alemanha, França e EUA, a imunidade limita-se a proteger palavra e voto, jamais a impedir processos. O Brasil, porém, insiste em institucionalizar uma democracia de castas. Cabe à sociedade reagir e ao Senado impedir que esse retrocesso se transforme em cláusula constitucional da impunidade.